Escravidão na África

A escravidão na África existe desde o Antigo Egito, mas ocorria de maneiras diferentes. Com a chegada dos portugueses, teve início a prática do tráfico de escravos africanos.
Escravidão na África retratada em uma gravura.
A escravidão na África teve início antes da chegada dos europeus ao continente.
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A escravidão na África existe desde os tempos do Antigo Egito, sendo esta de forma doméstica. Dessa maneira, o escravo poderia constituir matrimônio e ter posses (de terra, por exemplo). Esse modo de escravidão mudou a partir do contato com árabes muçulmanos quando estes ocuparam a região Norte do continente africano. Mudou mais ainda a partir do século XV com o tráfico negreiro.

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Resumo sobre a escravidão na África

  • A origem da escravidão na África remonta ao Egito Antigo.
  • A principal forma de escravidão na África era a doméstica.
  • O comércio de escravos a partir do contato com muçulmanos mudou muito a forma como a escravidão era praticada, e mais ainda a partir do século XV, com a chegada dos portugueses e o tráfico negreiro.
  • O fim da escravidão na África foi lenta, gradual e desigual.
  • A escravidão da África atual persiste em outros moldes.
  • A diferenças entre a escravidão na África e a escravidão no Brasil foram de cunho comercial e racial.

Quando começou a escravidão na África?

A escravidão na África existe desde o Antigo Egito. Aliás, a prática da escravidão é recorrente na história da humanidade, como acontecia no Oriente, e no Ocidente também, como em Roma e na Grécia, por exemplo. A escravidão na África era diferente antes dos colonizadores, pois não visava ao comércio.

Esses escravos eram chamados escravos domésticos e geralmente obtidos por guerras. Porém, nesse tipo de escravidão, os escravos podiam se casar e ter terras. Os escravos do Egito Antigo eram os que faziam os trabalhos mais pesados, ou seja, braçais. Foi só a partir dos séculos XV e XVI que passou a vigorar o modo escravista baseado no tráfico, advindo dos portugueses, principalmente.

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Formas de escravidão na África

As formas de escravidão na África eram:

  • doméstica;
  • por delitos;
  • em casos de extrema necessidade de um povo (que vendia os indivíduos);
  • islâmica;
  • por tráfico, depois da chegada dos europeus.

Na escravidão doméstica o povo vencedor conseguia os escravos através de guerras. Assim, parte do povo dominado virava cativo e a ele eram dados serviços como cultivo da terra e outros mais simples. Isso porque a maioria eram crianças e mulheres, que eram escolhidas justamente por nelas serem enxergadas possibilidades menores de insurreição contra a nova condição de escravizadas.

Além disso, especificamente as mulheres — que se tornavam concubinas — poderiam gerar novos filhos e povoar, uma vez que se julgava rico aquele que tinha mais gente trabalhando em seus terrenos. Seus descendentes, porém, vinham ao mundo já como livres, não escravos. De todo modo, pessoas escravizadas nesse modelo tinham direito à propriedade de terra e ao casamento.

Em alguns períodos e locais específicos, foram observadas vendas de pessoas para serem escravizadas quando determinado povo passava por dificuldades, como fome e seca. É o caso dos senas, em Moçambique, por exemplo. Raro, mas acontecia também de pessoas serem escravizadas como pena por adultério, roubo e demais delitos.

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Comércio de escravos na África

na escravidão islâmica, a prática começou a adotar ares de comércio, ou seja, visando a lucro. A partir dos primeiros encontros entre subsaarianos e árabes (quando estes, no século VIII, conquistaram o Norte do continente), foi iniciado um processo de islamização, o que também favoreceu as relações econômicas entre esses os povos, como no caso dos berberes|1|, que faziam expedições atravessando o deserto do Saara, alcançando várias terras subsaarianas para fazerem trocas de produtos, como o marfim, tecidos, cavalos, perfumes e, também, pessoas escravizadas.

Um sultão e seu exército, um exemplo de escravidão islâmica na África retratada em pintura.
O sultão Mulei Ismail rodeado da Guarda Negra, um exército composto por escravos.

Ao longo de mais de dez séculos de escravização islâmica, milhões foram escravizados. Entretanto, a escravização de muçulmanos era proibida, o que fez com que diversas conversões acontecessem. As formas de trabalho estipuladas pelos árabes eram, além do doméstico e agrícola, também de artesãos e carregadores em suas caravanas de comércios.

Nessa relação comercial, pessoas escravizadas perdiam direitos antes tidos na escravidão doméstica. Os senhores visavam a lucro e passavam a revendê-las. Porém, o lucro maior viria a partir do século XV, com as Grandes Navegações e chegada de europeus.

Escravidão na África após a chegada dos portugueses

Com a chegada dos portugueses ao continente africano, a escravidão tomou rumos diferentes dos já vivenciados naquele território. Daí em diante, pessoas especializadas passaram a capturar e aprisionar outras, que seriam escravizadas e enviadas a outros continentes. Primeiramente, a Europa; depois, as Américas.

→ Tráfico negreiro na África

O tráfico negreiro é um tipo de comércio de pessoas negras escravizadas, que ocasionou diversos conflitos internos na África, uma vez que muitos passaram a ver na conquista de outros povos uma oportunidade de lucro. Os maiores reinos adotantes dessa prática foram os de Ashanti e Daomé. Segundo alguns historiadores, a centralização política africana deu-se muito por conta disso, pois, ao centralizar o poder, fica mais fácil guerrear, dominar, tornar-se hegemônico, capturar, vender e até punir mais pessoas para serem escravizadas.

Interior de um navio negreiro retratado em pintura, um tipo de escravidão na África.
Interior de um navio negreiro retratado em pintura de Johann Moritz Rugendas, de 1830.[1]

Nesse novo modelo, as pessoas escravizadas não tinham nenhum direito, muito menos participavam da cultura local, ao contrário do que acontecia na escravidão doméstica. As relações comerciais ficaram tão grandes que, em determinado período, não mais eram suficientes pessoas e terras litorâneas. Assim, capturavam gente em outras regiões e levavam à Costa Oeste africana. Essas pessoas eram obrigadas a caminhar até o destino, acorrentadas e quase sem comida, para que não tentassem fugir.

Especificamente para a América, 12 milhões de pessoas foram escravizadas ao longo de três séculos. Estas vinham, principalmente, da África Ocidental e Central.

Fim da escravidão na África

O fim da escravidão na África se deu de maneira desigual em diferentes partes do mundo. Portugal, por exemplo, precursor desse tipo de exploração, aboliu a prática em seu território em 1733, com isso não mais exportava mão de obra negra escravizada. O mesmo não pode ser dito sobre suas colônias, que mantiveram a escravidão por décadas.

Em linhas gerais, o fim da escravidão obedeceu à mudança na lógica capitalista da obtenção de lucros, pois com a Revolução Industrial e o surgimento das novas classes, a burguesia necessitava de mercados consumidores. A partir de então, as potências imperialistas, em especial a Inglaterra, começaram a pressionar para que as colônias abolissem essas práticas. Isso se deu especialmente no século XIX.

No entanto, alguns países tiveram uma abolição muito tardia, como é o caso da Mauritânia — apenas em 1981.

Ainda existe escravidão na África?

A escravidão na África atual é uma prática que ainda persiste. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU): “Estima-se que mais de 40 milhões de pessoas estejam submetidas a trabalhos forçados, casamentos forçados e outras formas de exploração sexual”|2|.

Saiba mais: Revolta dos Malês — insurreição de africanos contra a sociedade escravocrata brasileira

Diferenças entre a escravidão na África e a escravidão no Brasil

As diferenças entre a escravidão na África e no Brasil foram: enquanto a africana tinha caráter doméstico, religioso e derivado de conflitos locais, a outra era extracontinental e caracterizada como um comércio, visando a lucro.

Para além disso, a escravidão no Brasil possuía um caráter racista. Os europeus trataram de desumanizar os africanos capturados e escravizados, bestializando os negros como uma raça inferior e sem alma, também utilizando-se de artifícios fabricados pela pseudociência europeia e baseando-se na Igreja, que condenava os africanos negros como desalmados.

Créditos da imagem

[1] Wikimedia Commons

Notas

|1| Africanos do Norte do continente que foram convertidos ao islamismo.

|2| UKOMADU, Angela; CHILE, Nneka. Escravidão persiste na África como um flagelo dos tempos modernos. Exame, 7 ago. 2019. Disponível em: https://exame.com/mundo/escravidao-persiste-na-africa-como-um-flagelo-dos-tempos-modernos/

Fontes

GUIMARÃES, Cecília Silva. O comércio de escravos na África Ocidental e Centro-Ocidental – século XVI. Disponível em: http://www.snh2011.anpuh.org/resources/anais/14/1300869409_ARQUIVO_CeciliaGuimaraesartigoAnpuh2011.pdf

SOUZA, T. T. B. A. de. Escravidão Interna na África, antes do Tráfico Negreiro. Revista Vértices, [S. l.], v. 5, n. 2, p. 11–24, 2010. Disponível em: https://editoraessentia.iff.edu.br/index.php/vertices/article/view/1809-2667.20030007

Por Mariana de Oliveira Lopes Barbosa
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